sexta-feira, 16 de julho de 2010

Desnudando a Dor da Alma


Creio que um ou dois anos se passaram desde que postei aqui. A maioria das colaboradoras que incentivaram a criação do blog não enviaram nada para colocar nele.
A ideia de criação de um grupo de apoio para as sobreviventes de abuso aqui no Recife também não foi adiante. Compreensível.
Eu mesma só consigo mexer neste tema de tempos em tempos, abre sempre um invólucro onde reside uma dor muito grande, incomensurável, uma caixa de pandora, onde só olhamos quando a esperança enterrada por baixo de todos os males indesejáveis escasseia por demais.

        Nestes tempo, desde o último post,  algumas coisas se passaram, entre elas o falecimento do familiar que abusou de mim. Quase por certo foi também vítima, uma vez que sua irmã recorda tê-lo sido, o abusador tinha acesso fácil às duas crianças e passar o abuso adiante é uma das sequelas possíveis na vítima. Sem tratamento, sem abrir a caixa maldita, pode se dar que a vítima repita o que sofreu. 
       Ou provavelmente eu esteja buscando desculpar essa pessoa tão próxima, tão querida, de quem não tive forças para me afastar até o dia da sua morte, embora me desprezasse por isso. Essa confusão de sentimentos é característica do incesto.

Assim como nos casos de mulheres que não deixam os pais ou padrastos abusadores cria-se uma espécie de síndrome de estocolmo em que nos identificamos com o agressor, acostumamo-nos a ele e passamos a depender de sua presença. Temos medo. O medo é nossa companhia constante, em relação a todas as coisas, ao todo da vida e ali ao menos a dor é conhecida e já devidamente anestesiada.
Qualquer movimento exigirá energia disponível, descongelar, e ao descongelar, lá estará a dor, lá estará a caixa de pandora com seu conteúdo maldito exigindo ser vista! Não, é insuportável. A maioria de nós, se suicida, seja de vez ou aos poucos, adultas mas não tão capazes assim de nos mantermos de pé, de caminhar por nós mesmas.
Contudo para tais dores mutiladoras que não são visíveis não há oferta de cuidados médicos ou apoio previdenciário.
 Tenho cuidado de aprender a sobreviver desde o falecimento em que me obrigada a olhar minha caixa de pandora. Compreendi porque, artista plástica, construía caixas, e colava delicadezas dentro. Passei a construir livros, scrapbooks, como se recém dona de uma história própria. Lentamente, de vez que a dor não diminui pelo distanciamento do fato. Não, a dor nunca para!
E não é mesmo fácil desnudar a própria alma para estar aqui, em exposição catártica, apelando por atenção e tratamento para tantas e tantos que vivem esta dor vivida no silêncio escondido das famílias.

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